Por Que Alguns Queijos Cheiram Tão Mal, Mas Têm um Gosto Tão Bom?

É uma experiência que desafia a lógica. Você se aproxima de uma tábua de queijos e um cheiro forte, pungente, que alguns descreveriam como “chulé” ou “meia suja”, invade suas narinas. Seu cérebro grita “Perigo! Não coma isso!”. Mas então, você cria coragem, prova um pedaço daquele queijo fedorento – um Gorgonzola, um Roquefort, um Brie – e… é delicioso. Complexo, salgado, cremoso, cheio de umami.

Como pode algo que cheira tão mal ter um gosto tão bom? A resposta para esse paradoxo delicioso está na complexa ciência da fermentação e na fascinante diferença entre como nosso nariz e nossa boca percebem o mundo.

Os Culpados Pelo Cheiro: Bactérias e Fungos em Ação

O cheiro forte de um queijo não é um sinal de que ele está estragado. Pelo contrário, é um sinal de que ele está vivo e que milhões de microorganismos (bactérias e fungos) estão fazendo seu trabalho perfeitamente.

Durante o processo de maturação do queijo, esses micróbios quebram as gorduras e as proteínas do leite. Esse processo, chamado lipólise e proteólise, cria uma vasta gama de novos compostos químicos. Muitos desses compostos são voláteis, o que significa que eles evaporam facilmente e viajam pelo ar até o nosso nariz.

O problema? Alguns desses compostos voláteis são os mesmos encontrados em lugares… menos apetitosos.

  • Ácido butírico: Presente em queijos como o parmesão, tem um cheiro que lembra vômito.

  • Ácido isovalérico: Encontrado em muitos queijos de casca lavada, é o principal responsável pelo cheiro de chulé. A bactéria usada para lavar a casca desses queijos (Brevibacterium linens) é a mesma bactéria que vive na pele dos nossos pés.

  • Amônia: Um cheiro forte e picante, comum em queijos de casca mofada como o Brie e o Camembert, liberado durante a quebra das proteínas.

Esses aromas, isoladamente, são desagradáveis. Nosso cérebro primitivo os associa a decomposição e perigo, por isso nossa reação inicial de repulsa.

A Mágica na Boca: Aroma vs. Sabor

 

Então, por que o gosto é bom? Aqui entram dois fatores cruciais:

  1. Aromas Retronasais (O Cheiro que Vem de Dentro): Quando mastigamos o queijo, os compostos voláteis são liberados dentro da nossa boca e viajam pela parte de trás da garganta até os receptores olfativos (um caminho chamado via retronasal). Essa “segunda forma de cheirar” se combina com os gostos básicos que nossa língua detecta (doce, salgado, azedo, amargo e umami), criando a percepção complexa que chamamos de sabor. Na boca, aqueles aromas fortes são equilibrados pelo sal, pela gordura cremosa e, principalmente, pelo umami (o gosto “saboroso”, presente no glutamato), resultando em uma experiência rica e prazerosa.

  2. A Expectativa e o Contexto: Nosso cérebro é inteligente. Quando sabemos que estamos comendo um queijo gourmet, e não uma meia suja, ele reinterpreta os sinais. A experiência passada e a expectativa positiva modulam nossa percepção, transformando um cheiro potencialmente ruim em um sinal de “complexidade” e “maturação”.

Em resumo: o queijo “fede” porque os aromas que chegam primeiro ao nosso nariz são os mais voláteis e pungentes. Mas, ao comê-lo, esses mesmos aromas se unem à cremosidade, ao sal e ao umami na boca, criando uma sinfonia de sabor complexa e deliciosa que nosso cérebro aprende a amar. É a prova de que, às vezes, precisamos superar nosso primeiro instinto para descobrir os maiores prazeres da vida.

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