À primeira vista, a ideia de um “sommelier de água” soa como o auge da pretensão, um conceito tão exagerado que parece saído de um roteiro de comédia. Um especialista em… água? A bebida que é definida por sua suposta falta de sabor, cheiro e cor? A reação inicial da maioria das pessoas é de ceticismo e até de zombaria.
No entanto, por trás da aparente simplicidade da água, existe um universo de complexidade, terroir e nuances minerais. E sim, a profissão de sommelier de água não apenas existe, como é levada muito a sério em círculos de alta gastronomia, hotelaria de luxo e por produtores de águas minerais premium.
Longe de ser uma piada, é uma carreira que exige um paladar altamente treinado, um conhecimento profundo de geologia, química e a arte da harmonização.
Afinal, Água Não é Tudo Igual?
Este é o primeiro mito que um sommelier de água derruba. A água que bebemos está longe de ser apenas H₂O puro. Sua jornada através de camadas subterrâneas de rocha e solo infunde nela uma assinatura mineral única, uma espécie de terroir líquido.
O fator mais importante que diferencia uma água da outra é o seu nível de TDS (Total de Sólidos Dissolvidos). O TDS mede a quantidade total de minerais (como cálcio, magnésio, sódio, bicarbonato) dissolvidos na água, medido em miligramas por litro (mg/L).
Águas com Baixo TDS (Águas Leves): Têm um sabor muito neutro, limpo e suave. São como uma tela em branco. Ex: Águas de degelo de geleiras.
Águas com Alto TDS (Águas Duras ou Minerais): Têm um sabor muito mais pronunciado e uma textura mais perceptível na boca. Podem ser levemente salgadas, amargas ou até efervescentes, dependendo da sua composição mineral. Ex: Águas de fontes vulcânicas.
Um sommelier de água treinado consegue identificar essas diferenças e descrever a água em termos de sua textura (leve, pesada, aveludada), mineralidade (salgada, calcária, etc.) e acidez (nível de pH).
O Trabalho do Sommelier de Água: A Arte da Harmonização
O papel principal de um sommelier de água na alta gastronomia não é apenas “vender água cara”. É garantir que a água servida complemente e eleve a experiência da comida e da bebida, em vez de prejudicá-la.
Imagine que você está prestes a degustar um vinho delicado e sutil. Se você beber uma água com alta mineralidade e sabor forte logo antes, ela pode “limpar” seu paladar de forma tão agressiva que você perderá as nuances do vinho. Nesse caso, um sommelier recomendaria uma água leve e neutra.

Por outro lado, se você está comendo um prato rico e gorduroso, uma água com alta carbonatação (gás) e mineralidade pode ajudar a limpar o paladar entre as garfadas, preparando-o para a próxima e tornando a refeição mais prazerosa.
O trabalho envolve:
Criar uma “Carta de Águas”: Selecionar uma variedade de águas de diferentes fontes e perfis minerais para oferecer aos clientes.
Harmonizar com Pratos: Recomendar a água ideal para acompanhar um prato específico, da mesma forma que um sommelier de vinhos faz.
Harmonizar com Outras Bebidas: Sugerir a água certa para acompanhar vinhos, cafés especiais ou destilados, garantindo que uma não anule a outra.
Educar os Clientes: Explicar as diferenças entre as águas e o porquê de suas recomendações, transformando a hidratação em uma parte integrante da experiência gastronômica.
Como Alguém se Torna um Sommelier de Água?
Existem certificações internacionais sérias, como a da Fine Water Society e a do Doemens Academy na Alemanha. Os cursos envolvem aulas teóricas sobre geologia, química e saúde, além de inúmeras sessões de degustação às cegas para treinar o paladar a identificar as sutis diferenças entre centenas de tipos de água de todo o mundo.
Portanto, da próxima vez que ouvir falar de um sommelier de água, em vez de revirar os olhos, lembre-se que por trás do conceito existe uma ciência real e uma dedicação profunda em aprimorar a mais fundamental de todas as experiências humanas: beber água.
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